Nasceu numa pequena aldeia rural na Freguesia de São Mamede, concelho da Batalha em 1977. Verónica Catarino, desde muito pequena que presenciou e vivenciou incêndios florestais que progrediam em direção à aldeia, que a cercavam e por ela passavam, colocando em risco as pessoas e habitações. Um dos incêndios de maior dimensão, violento e assustador, não consegue apagar da memória, em que arderam construções, algumas novas, e em que houve necessidade de evacuar idosos e crianças. Essas vivências, nomeadamente a sensação de impotência, marcaram-na desde muito jovem. Decidiu que seguiria estudos na área do ambiente e florestas, aliando o gosto que tem ao ensino.
Licenciou-se em Engenharia dos Recursos Florestais pela Escola Superior Agrária de Coimbra em 2000. Os primeiros passos na área de incêndios florestais são dados em Itália, em 1998, na Universidade de Turim, durante o estágio realizado através do programa Europeu Erasmus, participa também no Projeto Europeu INFLAME sobre Estudo e Simulação do Comportamento de Incêndios Florestais em Piemonte, utilizando Novas Tecnologias (FARSITE, GPS e ArcGIS).
Em 2011 termina o mestrado em Recursos Florestais, tendo defendido o tema “Estudo aplicado à ergonomia e segurança no combate a incêndios florestais”, e em 2008 conclui o curso de Pós-graduação em Gestão da emergência. Em 2001 torna-se formadora da Escola Nacional de Bombeiros (ENB), assumindo a responsabilidade da coordenação técnica da formação de combate a incêndios rurais. A partir de 2009 acumula as funções de formadora especialista com as de coordenadora do Centro de Formação Especializado em Incêndios Florestais (CFEIF) na Lousã.
Como tem sido o seu percurso nesta área dos incêndios rurais desde que está na Escola Nacional de Bombeiros?
Desde sempre que pretendi trabalhar na área dos incêndios florestais o que, aliado ao ensino, era para mim o percurso profissional ideal, ou assim o considerava quando iniciei, o que coincidiu com as minhas expetativas profissionais. No entanto, esta é uma área muito exigente, uma área com muita dinâmica tanto ao nível da investigação científica como a nível operacional, seja no âmbito nacional como internacional, e que está em constante evolução. Para além disso, devido à problemática dos incêndios florestais, é uma área de grande exigência e que não nos permite parar.
Assim, ao longo do meu percurso frequentei vários cursos, para além de seminários, workshops, webinars, mas destaco diversos cursos de análise de incêndios e fogo de supressão, pelo menos três cursos completos, sendo que obtive a credenciação como técnica credenciada em Fogo de Supressão pela ANEPC, e também frequentei o curso de Fogo Controlado sendo técnica credenciada em Fogo Controlado pelo ICNF, I.P., com experiência na execução de fogo controlado em contexto formativo desde 2001, tendo centenas de horas de práticas com fogo real em espaços rurais incluindo florestais. Desde que entrei para a ENB, mesmo antes da existência de diplomas legislativos nestas áreas de formação, que tenho ido para incêndios florestais, não só para análise como também para a melhoria da formação. Participei também em projetos europeus pela ENB como o IGNIS e perita no projeto MEFISTO. Atualmente inserida no projeto EVACUAR FLORESTA e FIRE RES.
A profissão de bombeiro é maioritariamente exercida por homens. Como tem sido a sua experiência ao longo destes anos?
Tem sido sobretudo um desafio e uma experiência exigente. No início, quando entrei para a ENB, foi muito difícil, porque era licenciada, mulher, jovem e a iniciar no mundo do trabalho. Ao longo do tempo julgo que fui sendo aceite e de alguma forma reconhecida, sobretudo pelo trabalho desenvolvido e pelo meu empenho.
Em 2009 tornou-se coordenadora do CFEIF. Quais foram os principais desafios que enfrentou e quais são os principais desafios que se colocam ao CFEIF?
Vários foram os desafios que enfrentei quando aceitei acumular as funções de formadora especialista com a de coordenadora do CFEIF. Um deles foi a organização geral do CFEIF, nomeadamente em termos de espaços, em termos de documentos, e em termos de limpeza de equipamentos e materiais obsoletos. Por outro lado, a necessidade de obras de requalificação nos espaços onde funciona o CFEIF, questões em que fui trabalhando até serem resolvidas; também a especialização do CFEIF, nomeadamente dos recursos humanos, formadores, e também a certificação do CFEIF pela ISO 9001, questões que se têm vindo a concretizar.
Atualmente, de forma global e a curto prazo, os desafios são o reforço da equipa com recursos humanos interessados na área dos incêndios rurais e no cumprimento dos objetivos da ENB. Para além disso, a aquisição de equipamentos previamente identificados à Direção da ENB. A médio prazo será a melhoria das condições do CFEIF, a existência de salas de formação maiores, com tecnologia e com condições diferentes.
Ao nível da formação, os desafios são constantes e mantêm-se atuais, como são a necessidade de atualização e melhoria contínua dos documentos da formação desta área de incêndios rurais, sendo que esta será certamente das áreas ou a área da ENB que contém mais cursos, mais Unidades de Formação de Curta Duração (UFCD), com todos os documentos inerentes a cada uma delas, seja para a formação externa ao CFEIF, ministrada pelos formadores externos nas ULF, como para a formação interna ministrada no CFEIF. E em que a legislação, normas e diretivas, são renovados(as) com mais frequência, para além de outros documentos que são publicados e que exigem a nossa atenção e tempo de leitura, sendo necessário um constante acompanhamento e esforço acrescido para atualização dos documentos da formação. Considerando que a equipa de formadores internos nesta área está a ministrar cursos durante praticamente todo o ano, de forma contínua, é de louvar o trabalho realizado pela equipa, nomeadamente neste esforço de melhoria dos recursos pedagógicos nesta área. Gostaríamos logicamente de ter mais tempo, mas o empenho da nossa parte existe constantemente. O desafio é também o do aperfeiçoamento técnico dos formadores desta área.
Os incêndios rurais, devido às alterações climáticas, serão um problema cada vez maior em Portugal… Os bombeiros estão bem preparados para responder a essa realidade?
Os incêndios rurais serão um problema cada vez maior não só em Portugal, como em todo o mundo, sendo que os desafios não são apenas nacionais, mas também da Europa e do mundo. Algumas questões como o abandono das zonas rurais e de atividades associadas à manutenção dos espaços rurais levam à acumulação de combustível, em áreas que se tornam contínuas e com maiores dimensões do que o eram há umas décadas. Combustível que com determinadas condições meteorológicas se tornam disponíveis para arder e com a agravante das alterações climáticas, nomeadamente pelo aumento das temperaturas, e não só, todas essas condições favorecem a progressão dos incêndios e aumentam a intensidade com que se desenvolvem e a sua capacidade de destruição.
Para além disso, a interface urbano-florestal ou interface urbano-rural, em que as casas são construídas na área rural / florestal e em que a área florestal entra pela área urbanizada, criam condições que aumentam determinantemente as exigências da resposta ao nível operacional, que vão muito para além do combate aos incêndios, exigindo respostas em termos de defesa das populações, de gestão das emergências e também uma elevada logística associada. Os bombeiros, homens e mulheres, enfrentam nesta área dos incêndios rurais grandes desafios, necessitando constantemente de formação e de treino para que se mantenham devidamente preparados para enfrentar os desafios relativos aos incêndios rurais e que são muitos, muito para além do que aqui descrevo.
Tem algum passatempo durante os tempos livres?
Praticamente não tenho tempos livres. Mas sempre que os tenho tento passá-los com a família, com a minha filha, e sempre que possível gosto de frequentar piscina, fazer caminhadas e fotografar e gosto muito de ver o mar, apesar de não o fazer tanto como gostaria.
Conselhos e recomendações – Incêndios Rurais
Nos incêndios rurais são muitas as regras de segurança que devem ser conhecidas e cumpridas por todos os bombeiros, não só no combate propriamente dito, mas em todas as operações associadas, recorda a coordenadora do CFEIF, Verónica Catarino.
Em 2021 foi lançado um curso em e-learning designado Segurança na Supressão de Incêndios Rurais que, entretanto, foi revisto e já está novamente disponível para ser frequentado. A coordenadora do CFEIF desafia todos os bombeiros a frequentarem este curso que é gratuito e que permite a certificação no final. O curso permitirá não só rever as matérias relativas à segurança como também aperfeiçoar conhecimentos.
Uma vez que nos aproximamos da época mais crítica para a ocorrência e propagação dos incêndios rurais é fundamental, segundo Verónica Catarino, que todos recordem a importância do seguinte:
Para mais informações:
Para melhor preparação física dos bombeiros, consultar o manual da ENB:
Para frequentar o Curso de Segurança na Supressão de Incêndios Rurais:
Formação a distância em Segurança na Supressão de Incêndios Rurais